Negócio de café dá origem a startup de marketing de influência que projeta faturar R$ 6 milhões

Quando ainda eram estagiários em uma startup de delivery em Vitória (ES), Matheus Barcelos, 30, e Matheus Marcellino, 30, não imaginavam que os choques de perfil entre eles dariam origem à Inbazz, negócio focado na Creator Economy brasileira, que já atende a clientes como Farm, Insider e Max Titanium e projeta faturar R$ 6 milhões até o fim do ano.
Na época, os dois trabalhavam na Shipp Delivery, empresa que anos depois seria vendida para as Lojas Americanas. Barcelos havia entrado em 2018, um ano depois de Marcellino, e logo os dois descobriram que pensavam de maneiras completamente diferentes — o que, à primeira vista, gerava atrito.
“Eu sempre fui mais voltado para a execução, para tirar as coisas do papel rápido. Já o Marcellino é o cara do planejamento, dos detalhes, de estruturar bem o pensamento”, lembra Barcelos. “No início, a gente 'tretava' muito, mas depois percebemos que essa diferença era justamente o que nos tornava uma boa dupla.”
Com o tempo, os dois deixaram de ser estagiários e foram promovidos a cargos de liderança. Participaram da estruturação da startup do zero, aprenderam sobre gestão, cultura de equipe e captação de investimentos — e acabaram convidados a se tornar sócios. “A gente viveu tudo: do zero ao exit. Ficamos quatro anos ali, aprendendo sobre como gerir de dentro e de fora”, diz Marcellino.
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Da xícara ao marketing
Quando a empresa foi vendida para a Americanas, Barcelos decidiu que era hora de começar algo próprio. “Eu queria viver a experiência de ter a minha própria empresa. Pensei: o café é um dos pilares da economia capixaba, posso servir o Brasil inteiro e ainda ter recorrência. A ideia parecia fechar todas as pontas”, conta. Assim nasceu o Boden Club, um clube de assinatura de cafés especiais, criado em 2018 com investimento inicial de R$ 30 mil, vindos de economias e da venda da startup anterior.
Marcellino, que havia migrado para o mercado financeiro, entrou como investidor e depois se juntou oficialmente ao negócio. No começo, a dupla enfrentou os desafios típicos de quem empreende sem estrutura: baixa margem, tíquete médio limitado e muita concorrência. “A barreira de entrada no mercado de cafés é baixíssima. Qualquer produtor pode criar sua própria marca. Isso come margem e dificulta escalar”, diz Barcelos.
Além disso, os dois tiveram dificuldades em atrair talentos. “Na Shipp, a gente trabalhava com tecnologia, era algo mais sexy. Já o clube de café era tradicional demais. Tivemos dificuldade de contratar bons profissionais”, diz o empreendedor. Mesmo assim, a experiência seria essencial para o que viria a seguir. “A Boden foi a escola do que fazer da porta para fora da empresa — entender contratos, acordos de sócios, estratégia e relacionamento com investidores”, complementa Marcellino.
Foi em meio aos percalços da Boden que nasceu o insight que mudaria tudo. Durante uma edição da Semana Internacional do Café, em Belo Horizonte, Barcelos comprou lotes de cafés premiados, acreditando que a qualidade garantiria as vendas. O resultado foi o oposto: “Comprei um monte de café achando que ia vender tudo. Não vendi. O café começou a perder qualidade”, conta.
A solução foi inusitada: distribuir os pacotes excedentes para criadores de conteúdo. “A gente não tinha verba de marketing. Então pensei: vou mandar para quem tem relevância no Instagram e cria bons conteúdos. A ideia era fazer as pessoas verem o Boden em todo lugar, como se todo mundo estivesse assinando o clube”, diz Barcelos.
O “teste” deu certo. As postagens espontâneas geraram burburinho nas redes, novos assinantes e o início de um programa de embaixadores da marca. Os criadores que mais vendiam recebiam recompensas — e a estratégia de gamificação trouxe resultados rápidos. Mas também trouxe um novo problema: a dificuldade de gerenciar manualmente dezenas de influenciadores, acompanhar conteúdos e calcular comissões.
Foi dessa dor que nasceu o primeiro esboço da Inbazz, criada oficialmente em 2024.
A virada para a Creator Economy
“A gente entendeu que o mercado estava saturado de plataformas de matchmaking, que conectavam marcas e influenciadores. Então decidimos não ser mais uma delas”, conta Marcellino. “Em vez disso, criamos uma ferramenta de gestão completa — como um CRM de creators e afiliados — que automatiza toda a jornada, do cadastro ao pagamento.”
Na prática, a Inbazz permite que marcas tragam sua própria base de influenciadores para dentro da plataforma. O sistema automatiza processos que antes eram feitos manualmente: aprovação de creators, integração com o e-commerce, rastreamento de vendas por cupom, cálculo de comissões e até a emissão de pagamentos via carteira digital.
“Tem cliente nosso com mais de 3 mil influenciadores, como a Max Titanium. Imagina fazer isso manualmente? Emitir nota por nota, Pix por Pix? A gente automatizou tudo”, explica Barcelos. A ferramenta também integra métricas de performance e conteúdo, permitindo acompanhar desde o ROI de cada influenciador até o custo por conteúdo e por visualização.
Outro diferencial é a gamificação. “Ela vem da nossa origem no programa de embaixadores. Hoje, as marcas usam isso para criar engajamento e relações de longo prazo com os creators, quase como fãs de marca”, diz Marcellino.
A Inbazz encerrou 2024 com faturamento recorrente de R$ 540 mil e, em menos de um ano, chegou a R$ 4,8 milhões — um salto de quase nove vezes. A projeção é encerrar 2025 com R$ 6 milhões. “Nosso crescimento é muito impulsionado pela satisfação dos clientes. Hoje, 86% dos novos leads vêm por indicação”, explica Marcellino. Entre os clientes estão nomes como Farm, Insider, Liv Up, Probiótica e Doctor Peanut.
O avanço chamou a atenção de investidores como a Stamina VC, que aportou capital para a expansão. A empresa trabalha com três principais fontes de receita: taxa de setup, mensalidade fixa (a partir de R$ 1.500 para até 100 creators) e um take-rate sobre as vendas geradas pelos influenciadores.
Mesmo com o crescimento rápido, os fundadores dizem manter os pés no chão. “A gente aprendeu muito com os erros da Boden. Hoje temos austeridade fiscal e uma mentalidade muito diligente. Não gastamos um real sem saber o retorno”, afirma Marcellino. “E montamos um time de missionários, não mercenários. Gente que acredita no projeto.”
A equipe soma 33 pessoas, todas contratadas diretamente, sem terceirização.
Em 2025, a Inbazz inaugurou seu escritório em São Paulo, na região da Berrini — um hub pensado para aproximar marcas, agências e creators. “Queremos que seja um espaço vivo, de conexão. Um ambiente para workshops, eventos e trocas genuínas”, diz Marcellino.
A empresa também prepara novos produtos. Entre eles, uma ferramenta de análise automatizada de conteúdos via inteligência artificial, capaz de avaliar se os posts estão aderentes ao briefing das campanhas. “Isso vai economizar muito tempo dos analistas de marketing”, diz Barcelos.
Para Barcelos, o país ocupa posição estratégica nesse mercado global. “O Brasil é uma potência. É o terceiro maior mercado do mundo em redes sociais, e a criação de conteúdo é uma das maiores alavancas sociais que existem hoje. Tem gente que há três anos estava quebrada e agora vive de publi, comprando apartamento”, afirma.
De acordo com o relatório Creator Economy 2024, desenvolvido pela Schwarzwald Capital, o país já figura como o segundo com maior número de criadores de conteúdo do mundo, com 110 milhões — atrás apenas dos Estados Unidos, com 140 milhões. “É um mercado gigantesco, mas ainda muito assimétrico. Nosso papel é ajudar a profissionalizar e dar previsibilidade a essa relação entre marcas e creators”, diz Marcellino.
Quando perguntados sobre como definem a trajetória desde 2018, os dois resumem em duas palavras. Para Barcelos, “consistência”. Para Marcellino, “diversão”.
“A gente trabalha muito, mas sempre com leveza. A jornada de uma startup é cheia de incertezas. A única forma de sustentar isso é se divertindo no caminho”, diz Marcellino. Barcelos concorda: “De 2018 pra cá, tirei dez dias de férias. Mas é o tijolinho de cada dia que constrói o que estamos fazendo hoje.”





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