"Não me via representada. Eram sempre rostos jovens";, conta Drica Divina sobre decisão de falar de beleza madura na internet

Uma das maiores criadoras de conteúdo de beleza madura do país, Adriana Tabuti conversa com a antropóloga Mirian Goldenberg sobre sororidade feminina nas redes sociais e padrões estéticos Em uma conversa com minha querida amiga Claudia Arruga, que conheci pelo Instagram no perfil @cool50s, falei sobre a rivalidade e a agressão que existe entre as mulheres nas redes sociais. “Não é contraditório defender sororidade e tentar desqualificar o trabalho de outras mulheres que deveriam estar juntas nas mesmas lutas?”, perguntei.
Claudia disse que, até recentemente, ficava chateada com mulheres agressivas e competitivas, mas que hoje ignora completamente esse tipo de comportamento. “Não podemos deixar esse tipo de postura nos machucar”. “Você tem que conversar com minha amiga Drica Divina. Ela faz um trabalho incrível no Instagram sobre a beleza das mulheres maduras. Algumas vezes ela recebe agressões horrorosas. Ela diz que passa um batom e corre”.
Adorei a ideia. Foi assim que conheci Drica Divina. Seu nome é Adriana Tabuti, “mas todo mundo me conhece como Drica Divina. É mais meu nome do que o meu nome mesmo”, brincou ela quando conversamos. Ela nasceu em São Paulo, tem 54 anos, é mãe de dois filhos, casada pela segunda vez. Formada em Direito, trabalhou durante muitos anos no setor financeiro de uma empresa industrial. Em 2012, já com mais de 40 anos, decidiu dar uma virada radical na vida, pois sempre soube que nasceu para falar sobre beleza, e se tornou uma influenciadora digital.
“Não foi fácil. Foi ousado, corajoso, talvez um pouco louco. Tudo começou a se transformar mesmo em 2019. Eu estava com 47 anos, consumia muitos conteúdos nas redes sociais, mas simplesmente não me via representada. Eram sempre rostos muito jovens, sem linhas, sem rugas, sem flacidez. Foi meu marido quem me incentivou a transformar isso. E foi assim que eu criei o @dricadivina com um novo olhar: voltado para mulheres maduras, reais, que ainda querem se sentir bonitas, vivas e valorizadas."
Tudo começou como uma forma de compartilhar suas vivências, os desafios que a idade traz, mas também as descobertas incríveis que só a maturidade permite. Drica tem mais de 2 milhões de seguidores no Instagram, TikTok, YouTube e Threads. Em 2023, foi a primeira criadora de conteúdo de beleza madura a ser indicada ao TIKTOK Awards e, em 2025, ao Ibest, prêmio que elege os melhores do ano na internet.
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Desde o início, seu conteúdo teve o mesmo propósito: promover aceitação, amor próprio e, principalmente, mostrar que beleza não tem prazo de validade. Drica fala sobre skincare, maquiagem, autocuidado, sempre com foco na mulher 40+, mas também provoca reflexões, porque, para ela, beleza é muito mais do que aparência: é postura, é escolha, é presença.
"Em vez de negar o envelhecimento, escolhi acolher. Nesse processo, acabei ajudando a mudar a forma como muitas mulheres — e também o mercado — enxergam essa fase da vida, e inspirando uma nova geração a abraçar a idade com graça e estilo. Porque a mulher madura não é invisível, não é descartável, não está 'no fim da linha'. Ela está mais forte, mais consciente, mais dona de si. Se antes diziam que o auge da mulher era aos 20, hoje estamos mostrando que ele pode começar aos 40."
Drica mexe com estruturas, sacode certezas, faz as mulheres refletirem de outro jeito, saírem da zona de conforto. E isso vem com um pacote completo: coisas incríveis, transformadoras, mas também reações negativas – algumas bem pesadas.
“O que me surpreendeu foi ver que os ataques que sofri vieram, muitas vezes, de outras mulheres. Especialmente por ser um tema que até pouco tempo atrás era um enorme tabu: o envelhecimento. A mulher era colocada num lugar de invisibilidade a partir dos 40, como se o valor dela diminuísse com a idade. Estamos vivendo uma virada muito bonita: mulheres maduras estão reivindicando seu espaço, sua voz, sua beleza. Eu me orgulho de ter sido parte desse movimento. Eu quis ir além, tocar num ponto que ainda hoje é silenciado: o climatério e a menopausa. E aí, confesso, o negócio ficou tenso. Mas foi necessário. Precisamos normalizar essas conversas, porque elas dizem respeito a todas nós."
Para Drica, o mais surpreendente foi perceber que muitas das mensagens de ódio que recebeu vinham de outras mulheres. Comentários cruéis, do tipo: “nossa, que nariz feio”, “sua pele é toda manchada”, “ela não se enxerga”, “fica em casa, sua velha”, “vai cuidar dos netos”, “ela quer parecer uma mocinha”, “seu tempo já acabou”.
“Foi muito difícil, mas, em vez de me silenciar, foi criando em mim uma couraça. Eu estava decidida a ocupar espaço nas redes sociais, queria fazer a diferença na vida de outras mulheres, compartilhar minha trajetória, meus conhecimentos, minhas vivências. Pensei: 'Vou passar por isso, vou mostrar que somos importantes’. Tem uma coisa que quase ninguém falava até então: o poder de mercado da mulher 40+. Todo mundo só falava da geração Z, mas quem sustenta o consumo, quem tem o dinheiro, quem compra inclusive para essa geração, é a mulher madura. A mulher que trabalhou, construiu, estabilizou sua vida, e agora quer consumir, se cuidar, se expressar. Eu queria provocar, sabe? Fazer as pessoas enxergarem a potência desse público. Era sobre representatividade, mas também sobre economia, presença e respeito." Com o tempo, Drica foi entendendo melhor o mercado, e entendendo também que não é todo mundo que vai gostar do seu trabalho.
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“Comecei a perceber que quando uma mulher ataca com agressividade, aquilo diz mais sobre ela do que sobre mim. Muitas dessas críticas vêm de um lugar de frustração, de dor. Porque enquanto tantas mulheres maduras estão se redescobrindo, se sentindo bonitas, vivas, potentes, outras ainda não conseguiram se conectar com essa força e acabam projetando isso nas outras, na forma de mensagens de ódio. Foi aí que, em nome da minha saúde mental, comecei a adotar algumas atitudes práticas. Aprendi a bloquear, a silenciar, a ocultar agressões. Não é fraqueza: é autopreservação. Hoje em dia, quando vejo esse tipo de comentário, não me dobro mais. Eu disse para a Claudia Arruga outro dia: 'passa o batom e corre'. Ou melhor: ‘posta e sai correndo’. Eu vou continuar, não importa o que você diga ou sua opinião.”
Drica começou a usar as mensagens de ódio como combustível e passou a expor algumas nos seus vídeos. Mais do que mostrar a violência dessas falas, ela queria refletir sobre autoimagem, sobre como a opinião alheia pode nos afetar e como podemos nos blindar e fortalecer. “Ainda existe uma carga muito forte de pensamentos machistas: aquela ideia ultrapassada de que a mulher tem que ficar em casa, que não deve se expor, que precisa ser contida, discreta. Isso aparece de forma velada, mas também escancarada, especialmente quando uma mulher madura decide se colocar, ocupar espaço, desafiar padrões.”
Drica acredita que precisamos continuar falando, aparecendo, nos posicionando. Porque não é só sobre uma história individual: é sobre todas as mulheres. Cada vez que uma mulher ousa ser quem é, ela abre caminho para muitas outras mulheres. Para ela, ser a Drica Divina não foi apenas assumir um nome: foi acolher uma missão.
“Quando me reconheci como uma mulher madura, plena e potente, percebi que poderia ser voz, referência e companhia para tantas outras mulheres que se sentiam invisíveis em um mundo que insiste em valorizar só a juventude. Na minha vida, isso significou resgatar minha autoestima, ocupar espaços com confiança e me reconectar com meu corpo, minha beleza e minha história. Mas o mais transformador tem sido ver outras mulheres despertarem através da minha jornada. Recebo mensagens de seguidoras que voltaram a se olhar no espelho com carinho, que retomaram sonhos, que passaram a se cuidar com mais amor. Ser a Drica Divina é lembrar que envelhecer é um privilégio e que maturidade combina, sim, com beleza, desejo e protagonismo. É uma revolução que começa em mim, mas vive em cada mulher que se reconhece nessa potência”, me contou ela.
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